terça-feira, 26 de maio de 2009

A FORÇA DO LUGAR

O estado atual da ordem legal internacional

Desde que surgiu na mente das elites européias – há aproximadamente quatro séculos – até a última metade do Século XX, o direito internacional foi considerado um facilitador, uma vez que expressava os termos de coexistência entre comunidades politicamente organizadas, que não reconheciam qualquer autoridade superior.1 Gradativamente, o Direito Internacional emergiu da derrota das ambições imperiais dos Habsburgos e das reivindicações papais para reger as vidas espirituais e morais de todos os povos da cristandade. Em processo análogo ao desenvolvimento aluvial da ordem entre habitantes indígenas, de aldeias remotas sem instituições políticas formais, líderes das comunidades européias — independentes de facto uns dos outros, mas estreitamente relacionados cultural, histórica e valorativamente para se considerarem de espécies diferentes — desenvolveram inevitavelmente um entendimento comum da natureza de suas relações e o caminho certo para lidar com casos de sobreposição dos direitos de soberania ou de incerteza no locus ou nos indícios de soberania.

De um modo geral, os governantes podiam viver como proprietários de terra, com liberdade para fazer o que bem entendessem em suas respectivas propriedades.

A Carta das Nações Unidas levou a lógica da igualdade de direitos e deveres ainda mais longe ao proibir o uso da força para privar os Estados de seus territórios e ao consolidar as atividades de elaboração e cumprimento das leis e de tomada de decisões autônomas contíguas à idéia de um Estado soberano.2

Ao longo de toda a Guerra Fria, essa proibição da Carta dominou o discurso sobre as obrigações dos Estados. Entretanto, durante o período de aproximadamente quatro décadas e meia – decorrido entre a fundação das Nações Unidas e o fim declarado da guerra – os Estados Unidos, por meio de forças regulares ou por “procuradores”, invadiram a Guatemala, Cuba, República Dominicana, Granada e Panamá; enquanto a União Soviética fez o mesmo na Hungria, Tchecoslováquia e Afeganistão. Além disso, ambos ignoraram os ostensivos direitos de soberania de outros Estados – a fim de manipular sua política interna – 3 ao adotarem uma série de meios ilícitos menos chamativos que a invasão. Quanto à desconsideração às restrições da Carta sobre a intervenção de um modo geral e o uso da força em particular, as superpotências, obviamente, não estavam sozinhas. A França, por exemplo, formou e desfez governos na África Ocidental de modo discricionário.


José Pereira Lima

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